A Sexualidade na infância
Um comportamento de grande aflição para pais e cuidadores é quando crianças passam a manipular seus órgãos sexuais. E, no afã de resolver esse “problema”, medidas drásticas são tomadas de forma precipitada e até mesmo traumática. Com isso em mente, vamos entender um pouco sobre o comportamento masturbatório infantil e como podemos ajudar as crianças autistas a redirecionarem sua atenção.
A Análise do Comportamento compreende que comportamentos são produtos de três níveis de seleção: o filogenético (relacionado às questões biológicas da espécie), o ontogenético (relacionado às questões de aprendizagem do indivíduo) e o nível cultural (relacionado às questões do meio social no qual o indivíduo está inserido), sendo o comportamento a raiz de tudo, incluindo o pensamento. Tudo que o homem faz é comportamento. Dessa maneira, podemos entender comportamento como fruto da interação do organismo com seu ambiente.
A partir dessa compreensão, podemos dizer que, para a ABA, a sexualidade é um comportamento que atravessa, assim como outros, os três níveis de seleção anteriormente citados. Saber isso é importante para compreendermos que os comportamentos relacionados ao sexo envolvem reforçadores primários, ou seja, as buscas por esses reforçadores estão relacionadas à evolução da espécie e não necessitam de nenhum tipo de aprendizagem. Dentre esses comportamentos estão presentes a estimulação física de áreas consideradas erógenas para a espécie humana.
Apesar disso, o comportamento sexual individual também está relacionado às aprendizagens ontogenéticas e aos contextos culturais. Aqui iremos focar no recorte biológico desse comportamento em crianças. A masturbação infantil, de forma geral, nada mais é do que a percepção de que diferentes lugares do corpo produzem diferentes sensações e que muitas dessas sensações são prazerosas. Algumas crianças, em especial após o desfralde, começam a explorar mais suas partes íntimas e entram em contato com essas novas áreas do corpo, passando a explorá-las. Mas esse comportamento está mais relacionado a questões sensoriais do que a qualquer tipo de erotização. Claramente é preciso fazer uma análise de cada contexto, pois não podemos descartar que esses comportamentos possam estar relacionados à modelação, processo de aprendizagem que envolve a imitação do outro. Contudo, aqui estamos analisando a faceta fisiológica da masturbação, e ela é algo natural e passageiro na infância.
Mas como lidar com isso, uma vez que é um comportamento não aceito socialmente e que pode trazer constrangimentos?
É preciso entender que nossos comportamentos são mantidos por consequências, sejam elas reforçadoras (que aumentam a probabilidade de uma resposta ocorrer novamente), sejam elas punitivas (que diminuem a probabilidade de uma resposta ocorrer novamente). Assim, uma abordagem proibitiva e/ou agressiva tende a impactar negativamente nos sentimentos e comportamentos da criança; apesar de num primeiro momento talvez diminuir a frequência da masturbação, o indivíduo pode aprender que esse comportamento é “feio” e “errado”, o que pode gerar confusões no futuro acerca desses conceitos e afetar como ele viverá sua sexualidade na fase adulta. Todavia, uma abordagem acolhedora e informativa ajuda a criança a passar por essa etapa de forma mais tranquila.
Exemplos de abordagens funcionais:
Inicie uma conversa com a criança e/ou crie uma história explicando por que não podemos tocar nossas partes íntimas em local público, dizendo que, se ele tiver muita vontade, pode fazer isso no banheiro ou no próprio quarto.
Aproveite esse momento para ensinar a criança o que são partes íntimas e quem pode tocar nelas. Essa é uma maneira de ajudar as crianças a estabelecerem limites em relação ao próprio corpo nas interações com outras crianças e com adultos.
Redirecione a criança para outras atividades. Uma vez que a atividade masturbatória é prazerosa, ofereça outra atividade altamente reforçadora, sem, no entanto, dar muita atenção ao comportamento anterior. Caso contrário, a criança poderá passar a emitir o comportamento de tocar as partes íntimas como uma forma de obter atenção de terceiros.
Converse com o terapeuta ocupacional. Provavelmente ele poderá orientá-lo em relação ao porquê desse comportamento e quais atividades podem ser ofertadas para a criança como alternativas.
Referências:
Chiesa, M. (2006). Behaviorismo radical: a filosofia e a ciência. Brasília: Editora Celeiro.
Luiselli, J. K., Helfen, C. S., Pemberton, B. W., Reisman, J. (1977). The elimination of a child’s in-class masturbation by overcorrection and reinforcement. Journal of Behavior Therapy and Experimental Psychiatry, 8, 201-204.
Martinez, C. K., Betz, A. M. (2013). Response interruption and redirection: Current research trends and clinical application. Journal of Applied Behavior Analysis, 46, 549-554.
Passos, M. D. L. R F. (2003). A análise funcional do comportamento verbal em Verbal Behavior (1957) de BF Skinner. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 5(2), 195-213.
Taiany Araújo
Psicóloga e Supervisora ABA – Grupo Conduzir
CRP 5.49646