Ensino Naturalístico
Quando falamos em intervenção em ABA, muitas pessoas pensam imediatamente em ensino estruturado que ocorre em ambiente controlado, seja no quarto ou na sala de terapia, mas sempre na mesinha. Aquela estrutura de terapia em que a criança permanece sentada e o terapeuta em sua frente, apresentando demandas no formato de ensino por tentativas discretas (o famoso DTT): o terapeuta apresenta a demanda; a criança responde e tem acesso ao item reforçador escolhido por ela. Tal modelo de ensino é de extrema importância e relevância para a aprendizagem de habilidades em crianças TEA ou com déficits de aprendizagem, mas ele não é o único! Existe uma série de diferentes modelos de ensino dentro da terapia ABA, e um deles é chamado de Ensino Naturalístico.
Essa estratégia de ensino é fundamentada no princípio de que todo comportamento ocorre de forma natural, uma vez que suas consequências são o próprio produto do responder. Por exemplo, quando encontramos alguém conhecido na rua, nossa resposta de dizer “oi” pode produzir a consequência de o conhecido responder “oi” de volta. Se essa consequência natural for reforçadora, a chance de nós cumprimentarmos alguém conhecido em outro momento similar a esse é muito alta. O ensino naturalístico cria situações em que a pessoa possa entrar em contato com consequências naturais das suas respostas. Ele também promove a generalização do comportamento aprendido em diferentes ambientes, pessoas e estímulos; ou seja, voltando ao exemplo anterior, a resposta de dar “oi” para alguém conhecido ocorrerá em diferentes ambientes (na rua, no shopping, no mercado) e com diferentes pessoas.
O ensino naturalístico envolve inserir alvos e objetivos de ensino a partir de uma atividade ou brincadeira altamente reforçadora (agradável) para a pessoa. Dessa forma, é possível garantir que o seu interesse direcione a intervenção do adulto, aumentando a chance de determinados comportamentos-alvo ocorrerem. Por exemplo, se o alvo é ensinar o repertório de imitação motora (olhar o que o outro faz e fazer igual), o adulto pode organizar o ambiente com brinquedos dos quais a criança mais gosta e deixar que ela se direcione ao objeto escolhido – um carro, por exemplo. A partir disso, o adulto pega o carro e o empurra pela pista, falando: “olha só, o carro está muito rápido na pista, vrumm”; a criança então pega outro carro e faz o mesmo movimento. De uma forma natural, a criança passa pela experiência de que imitar o que o outro faz é bom, pois traz consequências positivas – brincar de um jeito novo e divertido e receber a atenção do outro.
Muitas vezes, mesmo no ensino naturalístico, é necessário que o adulto ajude a criança a realizar o comportamento-alvo, o que é chamado de procedimento de dica. Essa ajuda ocorre de maneira flexível, apenas quando necessário, e sendo retirada aos poucos para que a criança venha a se comportar sozinha e sem nenhuma ajuda. No caso da brincadeira com carro e do treino de imitação motora, o adulto pode pegar na mão da criança e levá-la até a pista, onde a criança continua a brincadeira sozinha. Aos poucos o adulto para de pegar na mão da criança e deixa que ela faça todo o movimento sem ajudas.
Em uma simples situação de brincadeira no ensino naturalístico, muitas habilidades podem ser treinadas, como: pedidos (mandos – criança solicitar “vamos brincar de carro?”), imitações motoras, seguimento de instruções (adulto pode dizer “pega o carro azul?”), nomeação (tato – criança nomear o objeto como “carro” e a cor como “azul”), responder a perguntas (intraverbal – adulto pode perguntar “como o carro faz?”, e a criança responder “vrum vrum”), trocas de turno (uma vez o adulto, outra vez a criança), entre outras.
Portanto, o ensino naturalístico acontece a partir do que é de interesse da pessoa, garantindo motivação, diminuindo a probabilidade de comportamentos-problema acontecerem e aumentando a chance de os comportamentos aprendidos serem generalizados, uma vez que o ensino ocorre no ambiente natural da criança e traz consequências naturais que os mantém. Importante ressaltar que a combinação de uma intervenção baseada em ensino estruturado e naturalístico é essencial para que haja aquisição, manutenção e generalização de comportamentos-alvo.
Referências:
Sella, A. C., & Ribeiro, D. M. (2018). Análise do Comportamento Aplicada ao Transtorno do Espectro Autista. Curitiba: Appris.
McGee, G. G., Krantz, P. J., & McClannahan, L. E. (1985). The facilitative effects of incidental teaching on preposition use by autistic children. Journal of applied behavior analysis, 18(1), 17–31. https://doi.org/10.1901/jaba.1985.18-17
Por Isabella Caprini, Supervisora ABA do Grupo Conduzir
*O Grupo Conduzir declara que os conceitos e posicionamentos emitidos nos textos publicados refletem a opinião dos autores.