KIKA
A morte é, sem dúvidas, uma das palavras mais temidas desde que o mundo é mundo. Talvez por ser algo imprevisível, que atrapalha os sonhos; tira entes queridos para uma viagem só de ida… A primeira e única vez que experimentei essa palavra tão amarga foi quando a Tina, minha cachorrinha que me acompanhou dos meus 12 até os 20 anos, faleceu.
Um mês depois, já escutava burburinhos de adotar um cachorrinho… Isso me deixou indignado! Substituir alguém que faleceu há tão pouco tempo! Um absurdo. Uma cadela de uma amiga da minha mãe deu cria e, no fim, pouco tempo depois de meus pais e meu irmão virem com essa ideia de adoção, a democracia venceu e pegamos o filhote.
Depois de alguns minutos com aquela criatura minúscula com um rabo em formato de cocô, eu já me rendi à fofura do bichinho. Eu a batizei de Kika, sabe-se lá o porquê. Mas, convenhamos, batizar a coitada de Sailor Moon ou Hermione só poderia estar de sacanagem! Às vezes esse pessoal que curte animes e Harry Potter passam dos limites!
A cada dia que passava, eu gostava mais dela. Ela é bem diferente da Tina: A Kika é bem tranquila e sabe trazer os brinquedos que jogamos para ela. Já a Tina era o oposto: ranzinza; estressada e não levava os brinquedos de volta só para deixar os humanos com cara de paspalhos! Dizem que é coisa da raça (a Kika é um shih tzu, e a Tina era uma yorkie).
A Kika adora chamar a atenção: quando minha mãe não dá bola, a cachorrinha arranca um pedaço de uma planta da horta com galho e tudo. Já quando eu esqueço que ela existe, ela pega aquela pelúcia de macaco e fica cutucando meu pé com aquela coisa. Se eu ignoro, ela sobe no sofá com o bicho e começa a subir no meu colo, dá uma sacudida violenta na pelúcia para dizer: “Eu estou aqui! Olha para mim! Ninguém resiste a minha fofura!”
Agora percebo que, se não fosse por ela, a casa seria vazia, cinzenta e sem graça. Aprendi que a morte de alguém não deve ser motivo para parar de viver sua vida para sempre. Até porque aqueles que falam de eternidade são como uma estátua de vidro à beira do abismo. É como dizia aquela estrofe que a Cássia Eller cantava: “Se lembra quando a gente/chegou um dia a acreditar/ que tudo era pra sempre/sem saber que o pra sempre, sempre acaba”.
A vida é uma estrada em que se anda sempre para frente… Aqueles que ficam parados por muito tempo acabam atropelados, esmagados e mortos por arrependimentos; rancor; suposições impossíveis e apego ao que não te leva a lugar nenhum. Depois da morte de alguém, apenas boas lembranças e a sua própria história para continuar.
Matheus Cuelbas
*O Grupo Conduzir declara que os conceitos e posicionamentos emitidos nos textos publicados refletem a opinião dos autores.