O que é da idade e o que é do transtorno?
Toda criança faz birra, toda criança chora, desafia, toda criança é curiosa, toda criança em alguma fase tem uma seletividade alimentar maior ou, ainda, uma dificuldade de obedecer. Toda criança tem o processo de descoberta de si mesmo, dos seus próprios limites, dos limites do outro. Toda criança precisa aprender regras sociais e às vezes não as pratica. Toda criança é sincera e em algum momento não tem maturidade para entender metáforas…
São muitas características que mantêm as crianças neurotípicas e as autistas, durante um tempo, no mesmo patamar de desenvolvimento.
Existe uma grande dificuldade em detectar o que é típico da idade e o que é do transtorno do espectro autista, principalmente quando se trata de um autismo leve, quando se tem apenas um único filho e não há chance de vivenciar de perto um desenvolvimento “normal”.
Demora um tempo para nos acostumar com a maternidade atípica e tudo que vem com ela, demora um pouco para diferenciar as birras normais da idade da desorganização do início de uma crise.
Lembro de inúmeras vezes ligar para amigas próximas e perguntar se o filho também tinha esse ou aquele comportamento. Os comportamentos que nos levam a buscar um diagnóstico: falta de habilidade na comunicação, incapacidade de brincar de forma funcional, inexistência do brincar de faz de conta, falta de contato visual, necessidade de rotina, literalidade… são facilmente detectáveis. Mas alguns comportamentos sutis só os percebemos ser “filhos do transtorno” quando chega o tempo de irem embora, mas eles permanecem.
Um exemplo facilmente entendível é a falta de noção de perigo, o que aflige tanto o coração das mães dos indivíduos com autismo. Todas as crianças precisam de um tempo para entender os perigos do mundo, nos autistas esse processo é infinitamente mais lento.
Nada como conhecer bem o próprio filho e entender o seu comportamento, seja ele típico ou autista. O segredo é sempre o mesmo: paciência, amor e compaixão. Tanto pelo filho quanto por si mesma.
Não nascemos sabendo, não somos preparadas para uma maternidade atípica, erramos tentando acertar e acertamos sem perceber. Um dia de cada vez, uma vitória de cada vez, um aprendizado todo dia.
Michelle Carvalho, mãe do Enzo
*O Grupo Conduzir declara que os conceitos e posicionamentos emitidos nos textos publicados refletem a opinião dos autores.